Problemas no nervo ciático são dificilmente diagnosticados
Identificada a origem do desconforto, reforço da musculatura pode aliviar ou mesmo eliminar o incômodo
O motorista Flávio Werlei de Sousa, 38 anos, sofria com dor no nervo ciático desde 2007. O problema o incapacitou para o trabalho e fazia uma simples caminhada parecer uma maratona. Até obter o diagnóstico correto do mal, Flávio fez uma verdadeira peregrinação por ortopedistas, neurologistas e reumatologistas; chegou a ser submetido à cirurgia de varizes, que não amenizou em nada a agonia; e perdeu a conta da quantidade de medicamentos que tomou tentando se livrar do desconforto. “A dor era horrível, irradiava pela perna esquerda. Não encontrava posição que aliviasse. Era uma tortura”, conta. “Nem apontar o local que mais doía para os especialistas eu conseguia. Durante meses, tentei a fisioterapia e a acupuntura. Tudo em vão. Fiquei desesperado.”
A dor ciática acomete homens e mulheres em todas as idades. No entanto, é mais comum dos 30 anos aos 40 anos, faixa etária na qual excessos, como sobrecarga de exercícios e de peso, são mais frequentes. Coordenador do departamento de coluna da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, o neurocirurgião Márcio Vinhal explica que o ciático é formado por três raízes nervosas básicas com origem na coluna lombo sacra. “É o nervo mais longo do corpo humano, leva enervação para toda a musculatura dos membros inferiores, sendo responsável pela sensibilidade, flexibilidade e força da região lombar, nádegas, pernas e pés”, detalha.
Embora não existam estudos que comprovem a frequência da dor ciática na população brasileira, o especialista garante que ela é “alta” e virou um motivo recorrente de afastamento do trabalho e de atividades rotineiras. Vinhal pondera que a ciatalgia é sintoma de algumas doenças. “A hérnia de disco é a maior causadora desse tipo de dor, seguida da degeneração natural desses discos intervertebrais, cujas funções são evitar o atrito entre uma vértebra e outra e amortecer o impacto entre elas,”, revela. O comprometimento do ciático também pode ser resultado do escorregamento (deslocamento) da coluna e do encolhimento do canal vertebral, problemas que comprimem o nervo e, consequentemente, provocam a sensação dolorida. “A boa notícia é que os males podem ser controlados. Apenas 10% dos pacientes com dor ciática precisam de tratamento. A cirurgia deve ser o último recurso, indicada quando as outras terapias falharam”, especifica.
Dirigindo ônibus em viagens interestaduais, Flávio Werley de Sousa passava toda a jornada de trabalho sentado, um fator de risco para a dor ciática. Esportistas que submetem o corpo a impactos de alta intensidade também estão mais expostos a traumas na inervação, fraturas na lombar e à própria hérnia de disco. O motorista tinha duas, além de artrose na coluna. “Não conseguia mais dirigir. A dor também me tirou o sono. Minha vida estagnou. A cirurgia foi feita na segunda-feira de carnaval e já consigo caminhar sem sentir o incômodo. Comecei a fazer a fisioterapia para recuperar os movimentos”, conta.
A aposentada Lenita Guimarães Muniz, 62 anos, também é vítima da dor ciática. Assim como Flávio, antes de ter o diagnóstico de hérnia de disco entre as vértebras L4 e L5, ela peregrinou por diversos consultórios médicos. “Minha dor irradiava pelas nádegas e pernas. Não tinha força para andar. Era como se eu não conseguisse comandar meu próprio corpo. Caí algumas vezes, fiquei de cama”, conta. Lenita encontrou na hidroterapia e na acupuntura duas grandes aliadas. “Sem elas não estaria andando. A hidro fortalece o ciático e solta a musculatura. A acupuntura cuida do processo inflamatório e ameniza a dor. Elas estão incorporadas na minha rotina. Se fico uma semana sem fazer qualquer uma das duas, meu nervo retrai e o pesadelo volta”, resume.
Sintomas
O presidente do comitê de coluna da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot), Sérgio Zylbersztejn, acrescenta que sequelas de fraturas na porção inferior da coluna, tumores que comprimem o nervo e doenças reumáticas também podem causar dor ciática. A ciatalgia se manifesta como queimação, fisgadas, dormência e falta de sensibilidade, ocorrendo no local da lesão ou em uma região que o nervo percorre. “O segredo do tratamento depende da descoberta da causa. O médico deve pesquisar e indicar a origem da dor. Isso transcende a especialidade. O importante é procurar um profissional de confiança que se empenhe na busca”, aconselha. O diagnóstico demanda pesquisa clínica e exames, como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada.
Confirmado o diagnóstico, é indicado o tratamento medicamentoso, sempre aliado a exercícios físicos direcionados e terapias que aliviam os sintomas, como a acupuntura. “A hérnia de disco tem natureza genética. Fortalecer a musculatura de suporte da coluna é fundamental para todos, mas para quem tem tendência ao mal, ela é vital”, garante. Controlar o peso, ter boa postura, e não deixar os músculos preguiçosos postergam ou até evitam a manifestação do problema. A cirurgia controla os sintomas e alivia rapidamente a dor incapacitante, mas deve ser indicada em último caso. “Menos de 5% dos pacientes que sofrem dor ciática em decorrência de hérnia de disco têm indicação cirúrgica. Muitos procedimentos são realizados sem necessidade”, confirma Zylbersztejn.
Atividade física é fundamental
Um tratamento fisioterapêutico que alia fisioterapia manual, com mesas de tração e descompressão do ciático e das estruturas posturais da coluna vertebral, além do trabalho de musculação ou pilates, tem trazido bons resultados no controle da dor originada no nervo ciático. “Existe um tabu muito grande por parte de pacientes que sofrem com hérnia de disco em relação à atividade física. Muitos acreditam que ela é proibida. Estudos comprovam justamente o contrário. O sedentarismo é uma das principais causas de problemas no ciático e na coluna lombar”, explica Helder Montenegro, fisioterapeuta osteopata do Instituto de Tratamento da Coluna Vertebral, presente em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Fortaleza.
A proposta da equipe do fisioterapeuta consiste em um protocolo que reúne várias técnicas. Juntas, elas atuam na reconstrução músculo-articular da coluna vertebral. Segundo Montenegro, diante da comprovação médica que identifica o local da lesão no ciático, a primeira etapa do programa é a fisioterapia manual para soltar a musculatura, seguida do tratamento em mesas de tração. “Elas promovem a força descompressiva no eixo da coluna, aumentando o espaço intervertebral, alongando os músculos e melhorando a mobilidade dos ligamentos. Em suma, aplacam a dor e permitem que a pessoa volte a se movimentar bem”, sintetiza.
Controlado o desconforto, o tratamento é complementado com musculação ou pilates, que proporcionam a manutenção dos benefícios da primeira etapa. “Eles previnem novas crises. Bem orientados e direcionados, os exercícios produzem o efeito terapêutico desejado sem sobrecarregar as estruturas de risco. Temos resolvido 87% dos casos que chegam até o instituto”, aponta o fisioterapeuta.
A bancária Gorete Meneses, 48 anos, foi um deles. Ela revela que a dor no ciático a impedia de ficar sentada e que os médicos tinham indicado a cirurgia de hérnia de disco. “Fiz o tratamento para tentar me livrar do procedimento cirúrgico. A dor está controlada, recuperei os movimentos e não abro mais mão do pilates, que revigorou minha estrutura física”, destaca.
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